A época em que vivemos, com todas as transformações científicas e tecnológicas, certamente engoliu boa parte dos cientistas sociais, comunicólogos e afins.
Sou um dinossauro que vivi a defesa da reserva de informática nacional, vivi a época em que na URSS se dizia que um computador era o equivalente a uma arma de guerra, vivi a época das escolas de datilografias, trabalhei com as IBMs de esferas e corretivos na própria máquina e tive a sorte de, em 1984, conhecer os primeiros computadores instalados na Assembleia Legislativa. Ali, aprendi a lidar num.
É claro, acompanhei a queda do muro de Berlim, a derrubada da cortina de ferro, a transição de Gorbatchov/Ieltsen, assisti ao assassinato de Somoza, enfim, nada na América Latina, de El Salvador ao Chile de Allende, nada me foi estranho. Com 15 anos escutava a rádio Central de Moscou, que a meia noite iniciava as transmissões em português, sabia tudo sobre o Livro Verde e terceira teoria universal de Kadafi. Muito jovem li Toffler e George Orwell; e a rigor, a modernidade expressa na telemática e na robótica não me soaram estranheza.
Como fui pai de uma menina aos 50 anos, hoje, graças a ela, convivo com uma outra outra realidade totalmente inserida nos smarthones. É claro, passei pelo Orkut, msn, facebook, instagran e graças a minha filha, Nina, fui jogada para a realidade de aplicativos moderníssimos, cheios de recursos, como o todoist.
Porém, particularmente, me chama a atenção o surgimento de uma interação mundial entre as crianças e adolescentes; a partir do Likee, aprendi com minha filha a priorizar as hashtags, assim como com o app ampliar os followers nas redes.
É claro, um dinossauso que estudou sociologia, afora o Toffler e o Orwell, necessariamente estudou os livros “A Sociedade em Rede” (é uma trilogia) e o protagonismo (nada original) do sociólogo espanhol Manuel Castells.
Nem o EAD e nem processo eletrônico do poder judiciário brasileiro me soaram estranheza, apesar da barbeiragem e do socorro do expert Giovani Diedrich.
Do enriquecimento do urânio ao peso das redes sociais na primavera árabe, evidentemente que já passamos para a nova idade não codificada.
Segunda-feira, ouvia um áudio de um tenente-coronel do exército e confesso que fiquei chocadíssimo. O cara apresentava como um grande problema do mundo o islamismo, junto com o narcotráfico e a corrupção. A culpa é do Olavo de Carvalho, que enfiou um monte de conhecimento empastelado na cabeça de seus discípulos e os caras vivem cometendo grandes despautérios. Agora, muitos militares e a direita parecem que descobriram o islamismo.
Socorro. Será que nada sabem de Maomé?
Não precisa saber o nome completo (Abul Alcacim Maomé ibne Abdalá ibne Abdal Mutalibe ibne Haxim), basta chamar pelo nome de guerra, Maomé, que nasceu em Meca no ano 571 depois de Cristo e foi abduzido aos céus, justamente em Jerusalém, em 632. Se soubessem isso, entenderiam o Likud e a proposta de transferir a capital de Israel de Tel Aviv para Jerusalém; e fingimos que não sabemos que é uma tentativa de expulsar os mulçumanos e destruir a mesquita de Al-Aqsa, que nós conhecemos como O Domo da Rocha (ou Cúpula da Rocha); pois foi ali Abraão ensaiou o sacrifício de Isaac, seu filho. Será que não sacaram a jogada da direita israelense?
Ou será que não sabem que em Jerusalém coabitam cristãos, mulçumanos e judeus? Não vou querer então que entendam a razão das cruzadas, o cerco de Viena (Lutero era totalmente anti-islã) ou mesmo a Revolta dos Malês, aqui mesmo no Brasil. No meu tempo, os oficiais superiores eram sábios e quem escreveu sobre os Malês foi justamente um gaúcho, chamado Décio Freitas, que, dentre tantos livros deixou-nos: A Revolução dos Malês.
A revolta dos malês é uma parte de nossa história que poucos conhecem, mas foi um levante de negros escravos islâmicos, que ocorreu na Bahia, em Salvador, no ano de 1835. Foi a primeira e única revolta islâmica que houve em solo brasileiro.
Aí eu me pergunto? Como um tenente-coronel não sabe disso? Será que ele descobriu o islamismo com o Olavo de Carvalho e não sabe sequer que já tivemos uma revolução islâmica no Brasil?
É, Umberto Eco tem lá suas razões. Cala-te boca.
Entendo que o conhecimento no youtube é um perigo: empastelamento e pasteurização( não me refiro a Pasteur, cuidado com a polissemia que decorre dos conceitos nas ciências sociais com o simples conceito dos dicionários de língua portuguesa). Bem, é claro, é necessário compreender que a importância dessa ferramenta das redes sociais, a qual a direita se apropriou e deu um show na esquerda.
Enfim, as mudanças de paradigmas são muitas, embora a academia no Brasil continue mergulhada nos mesmos clássicos e querendo que o mundo gire em torno da USP. É o próprio narcisismo acadêmico que só observa o mundo a partir do seu umbigo, de suas verdades e de sua produção, a qual julga ser absoluta, única e dogmática. É a própria religião com outra roupagem. E ainda criticam os religiosos.
Mas escrevi essa pequena crônica pois ando farejando algo novo nas relações inter-pessoais de crianças e adolescentes, quiça até adultos, com essas modernas redes de tradução instantânea. Minha filha curte uma banda da Coréia, uma da Rússia e tem vários amiguinhos e amiguinhas – através do Likee – em vários países. É claro que dessas relações decorrem aspectos relacionados aos hábitos, costumes, valores, moda, gostos e etc (como diz a Nina).
O mundo vai ficando pequeno e não faço apologia as Pedras da Geórgia e nem defendo a redução drástica da população mundial.
De novo, volto à Sociologia, e como me foram úteis às disciplinas de “População e Desenvolvimento” e “Dinâmica Populacional”, lá atrás, nos anos 80, estudei muito a curva malthusiana. Explico: Malthus pregava que o desenvolvimento da população crescia em progressão geométrica, pari passu, a geração e produção de alimentos em progressão aritmética. Por isso que os iluminattis querem matar 7 bilhões de pessoas para desafogar o planeta kkkkk.
O certo é que vivenciamos uma nova revolução dentro da revolução cibernética (os comunistas antigos adoravam essa expressão). Telemática é muita modernidade para os jurássicos. A minha filha não tem a menor noção de quem seja eu. Nunca entenderá tudo o que estudei. Mas eu, ao contrário, entendo-a, e aprendo muito com ela. Foi com ela e suas relações entre aplicativos que notei a emergência de uma consciência e inter-relação planetária entre crianças, com trocas de experiências e formação de um pensamento crítico mundial muito desenvolvido acerca do meio ambiente, do amor, das liberdades … é algo novo, transformacional, além das ideologias tradicionais, mas, imprevisível.
Daqui uns tempos surgem os estudos sobre este recente fenômeno social. Aí os donos das academias bolorentas e os PPGs com sua tradicional arrogância vão querer sistematizar um pensamento e botar numa camisa de força, com simplificações grotescas e conclusões ajustadas aos interesses ideológicos.
Mas não impedirão a primavera dessas crianças de hoje. Minha filha acha que o facebook é coisa de velho e que ficam ali se cantando rsrsrsrsrs. Talvez ela tenha razão, o facebook facilitou tudo para nossa vida, embora seja muito mais uma teia do que uma rede.
Pelo sim, pelo não, estamos todos mais próximos. A geração das crianças de hoje é muito mais amor, tem muito mais consciência sobre a vida, sobre a natureza, sobre os pais, são mais sensíveis, mais amorosos, e, certamente, farão um mundo melhor no futuro. Ao modo deles, porque nós, somos estupidez pura.