Acabei de lei MÔNICA BERGAMO na Folha de São Paulo. Se me contassem, diria que era fake news.
Pela madrugada recebi diversos discursos de líderes do movimento. São discursos padrões enviados para toda a imprensa.
Contudo, é chocante a leitura de conjuntura dos caminhoneiros. Pensam em parar o país e sonham em impedir a posse de Lula.
É claro, são pessoas sinceras. Mas o movimento é desprovido de leitura social, política e econômica.
Um processo revolucionário de proporções nacionais, como eles pregam, implica em vários fatores, que são as condições subjetivas e objetivas de um processo revolucionário.
Primeiro, é um movimento acéfalo. Segundo, eles contam com aliados fictos, pois o agro pode até ter simpatias, mas não é um movimento organizado para derrubar todo o establishment de um país. A cadeia produtiva do agro é burguesa e nunca teve dimensão revolucionária. É claro que o agro vai pagar um preço alto com a política do PT, mas será gerado um desgaste a médio e longo prazo. Nada de soco, de imediato. Primeiro, serão todos bem adoçados à Alckmin!
Por outro lado, o PT sabe como contornar e controlar as FFAAs. É só darem um aumento aos praças e estará semeada a discórdia dentro dos quartéis. Mas nem isso os petistas farão. Darão aumentos para os praças, suboficiais, oficiais e oficiais superiores. Eles sabem como a tropa reage, basta dinheiro. Sempre foi assim e continuará sendo assim.
No governo Bolsonaro, quando os generais 4 estrelas, elaboraram os planos para o Brasil 2035, eles nunca sonharam com a vitória de Lula. Do contrário não teriam pregado aquele disparate acabar com a gratuidade do SUS e das universidades e institutos federais. Isso foi decisivo para uma tomada radical de posição da academia, até conhecidos direitistas da UFRGS e da UFSM.
Ademais, esse movimento, que bloqueia as estradas, é dissociado do conjunto da sociedade. Mesmo que eles tentem agregar o agro, não encontram eco nas demais classes sociais do país. Afinal as classes C, D e E são, por suas lideranças, vivamente petistas e afins. Nisso, a esquerda manteve uma incrível unidade, dos movimentos de bairros, passando pelos colonos com pouca terra e chegando nas universidades ao passo do movimento sindical e associativo.
O governo Bolsonaro não fez nenhuma articulação para contrapor a insurgência contra si que estourava no MEC e os ministros de educação bolsonaristas eram ridículos; e o que é pior: davam discursos contra a própria tentativa de as pessoas estudarem. Era claro a concepão de elite, o ensino superior não é para todos, é para a elite. Sem contraponto, os polos ficaram expostos e ampliou-se a cisão na sociedade brasileira.
Por outro lado, Bolsonaro e os seus ignoravam os exorbitantes aumentos nos alimentos, fato que massacrava as classes C, D e E da sociedade brasileira. Embora tenhamos pobres que pensam como ricos, não tem como controlar a grande massa das classes D e E que são os setores mais oprimidos, aí incluem-se os presos e os familiares, que foram todos jogados no colo do PT, mesmo os que não eram.
Assim como Lula errou feio em acusar o agro de fascista, Bolsonaro (e seu staff) errou feio em atacar os presos e famílias dos presos.
Em suma, esse movimento dos caminhoneiros pedindo intervenção militar, peca em sua base, pois sequer se articularam com os militares, que não entram em aventuras breves. Ademais, é um movimento social que afeta toda a sociedade e não tem relação com os demais setores da sociedade. O agro atinge uma parcela das classes A e B, mas é desvinculado do conjunto da sociedade, exceto aqueles que negociam com si diretamente. Eles não fazem isso por maldade, não é. Fazem isso porque as condições financeiras os diferenciam. Por isso eu discordei da crítica de generalizar o agro como fascista, assim como eu achei uma burrice sem precedentes do Lula defender a convocação de uma nova assembleia nacional constituinte, embora muitos críticos tenham me dito que ele só falou em criar uma nova constituição. Devem imaginar uma nova constituição por decreto ou por emenda. Soa piada.
Em suma, nem a intentona comunista no Brasil, em 1935, que tinha fortes ramificações militares, pois vinha do tenentismo, cujas raízes estão em 1920, portanto, sem a devida e necessária articulação nacional, embora fosse de esquerda a intentona. Quem provou que detém articulação nacional para um eventual golpe são as forças armadas, mas que – sozinhas e isoladas do contexto político internacional – não tem expressão significativa e nem força. Há quantos anos nossas FFAAs estão desvinculadas da imprensa, dos jornalistas, dos pensadores, dos intelectuais, dos escritores?
Reafirmo para todos que eu sou apenas um observador dos movimentos no Brasil e no mundo. Não escrevo para convencer a ninguém e nem tenho a pretensão de dividir opiniões, embora meu blog tenha completado 20 anos no dia 22 de março desse ano.
Sempre disse para todos meus amigos que, se eu não trabalhar e correr atrás da máquina, eu não vivo, para mim, para a minha vida e minha profissão, tanto faz Lula quanto Bolsonaro. Não muda nada.
É claro, as maiores perseguições que eu sofri vieram do lado do PP e do PT, indistintamente. Por isso, não pedi votos para nenhum candidato a presidência.
E estou convencido que ainda trilho o melhor caminho. Acho complicado nós, da imprensa, assumirmos uma bandeira e vivermos de apologia a um só lado, como se existisse apenas uma razão e uma verdade.
Quando eu critico os movimentos, como esse dos caminhoneiros, eu apenas tento contextualizar suas bandeiras e analisar suas perspectivas de sucesso ou de insucesso. Não sou contra e nem a favor. O problema aqui em Santiago é que muitas pessoas ainda não aprenderam a conviver com um pouquinho de análises, que é o que eu faço, pois não me dedico somente a escrita jornalística, eu trabalho e me sujeito a horários como qualquer trabalhador de outro segmento profissional.
Ademais, sejamos francos, eu não peço para ninguém ler meu blog. Lê, quem quer.