De 458 a.C. a 2018 d.C.: da derrota da vingança à vitória da moral!

* Lênio Luiz Streck

Coincidentemente, no dia do julgamento do recurso do ex-presidente Lula no TRF-4 me encontro na Grécia. E visitei o templo da deusa Palas Atena. Fiquei pensando sobre a história. Eu estava ali, no berço da civilização. E vendo o “lugar” em que a mitologia coloca o primeiro julgamento da história.

Os gregos inventaram a democracia. E, acreditem, também inventaram a autonomia do Direito. O primeiro tribunal está lá na trilogia de Ésquilo, Oresteia, nas Eumênides, peça representada pela primeira vez em 458 a.C. Agamenon, no retorno da guerra de Troia, é assassinado na banheira de sua casa por sua mulher, Clitemnestra, e seu amante, Egisto. Orestes, o filho desterrado de Agamenon, atiçado pelo deus Apolo, é induzido à vingança.

Até então, essa era a lei. Era a tradição. Orestes deveria matar sua mãe (Clitemnestra) e seu amante, Egisto. E ele mata os dois. Aí vem a culpa. É assaltado pela anoia, a loucura que acomete quem mata sua própria gente. Ao assassinar sua mãe, Orestes desencadeia a fúria das Eríneas, que eram divindades das profundezas ctônicas (eram três: Alepho, Tisífone e Megera). As Eríneas são as deusas da fúria, da raiva, da vingança (hoje todas as Eríneas e seus descendentes estão morando nos confins das redes sociais). Apavorado, Orestes implora o apoio de Apolo. Pede um julgamento, que é aceito pela deusa da Justiça, Palas Atena.

Constitui-se, assim, o primeiro tribunal, cuja função era parar com as mortes de vingança. Antes, não havia tribunais. A vingança era “de ofício”. As Eríneas berram na acusação. É o corifeu, o Coro que acusa. Não quer saber de nada, a não ser da condenação. E da entrega de Orestes à vingança. Apolo foi o defensor. Orestes reconheceu a autoria, mas invoca a determinação de Apolo. E este faz uma defesa candente de Orestes. Os votos dos jurados, depositados em uma urna, dão empate.

Palas Atena absolve Orestes, face ao empate. O primeiro in dubio pro reo. Moral da história: rompe-se um ciclo. Acabam as vinganças. É uma antevisão da modernidade.

Em pleno século XXI, autoridades não escondem e acham normal que o Direito valha menos que seus desejos morais e políticos. Na Oresteia, os desejos de vingança sucumbiram ao Direito. Embora a moral seja uma questão da modernidade, é possível dizer que o Direito, nesse julgamento, venceu a moral. Não aprendemos nada com isso.

Como falei alhures, o julgamento de Lula não é o Armagedom jurídico. Mas que o Direito já não será o mesmo, ah, isso não será. Na verdade, o Direito foi substituído por uma TPP (teoria política do poder). O PCJ (privilégio cognitivo do juiz) vale mais do que as garantias processuais e toda a teoria da prova que já foi escrita até hoje.

O mundo apreendeu muito com a Oresteia. Depois do segundo pós-guerra, aprendemos que a democracia só se faz pelo Direito e com o Direito. E o Direito vale mais que a moral. E, se for necessário, vale mais do que a política. Sim, quem não entender isso deve fazer qualquer coisa — como Sociologia, Ciência Política, Filosofia, religião, moral etc. —, menos praticar ou estudar Direito.

Temos um milhão de advogados, parcela dos quais se comporta como as Eríneas das Eumênides. Vi, entristecido, aqui da Grécia, nas redes sociais brasileiras, pessoas formadas em Direito — muitas delas com pedigree — torcendo por coisas como “domínio do fato”, “ato de ofício indeterminado” e quejandos. Parece que esquecemos que o Direito é/foi feito exatamente para impedir o triunfo das Eríneas.

Meus 28 anos de Ministério Público e quase 40 de magistério mostraram-me que, por mais que um discurso moral, político ou econômico seja tentador, ele deve pedágio ao Direito. Alguém pode até confessar que matou alguém, mas, se essa confissão for produto de uma intercepção telefônica ilícita, deve ser absolvido, porque a prova foi ilícita. Esse é o custo da democracia. Você pode pensar o que quiser sobre o réu; mas, como autoridade, só pode agir com responsabilidade política. Dworkin, para mim o jurista do século XX, sempre disse que juiz decide por princípio, e não política ou moral. Simples assim. E, assim, o custo da democracia é que a acusação, o Estado, deve ter o ônus da prova. Não é o juiz que faz a prova nem é o juiz que intui provas. A teoria da prova é condição de possibilidade. Ou vamos apagar centenas de anos de teoria da prova.

Isso quer dizer, de novo — e minha chatice é produto de minha LEER (Lesão Por Esforço Epistêmico Repetitivo) —, Direito não pode ser corrigido pela moral. Isso tem me conduzido. Disse isso nos momentos mais difíceis, inclusive no caso das nulidades contra Temer, de Aécio e dos indevidos pedidos de prisão do ex-presidente Sarney. Bueno: é só acessar minhas mais de 300 colunas neste site. E meus mais de 40 livros. E 300 artigos. Todas as semanas denuncio, aqui na ConJur, a predação do Direito pelos seus predadores naturais — a moral, a política e a economia. E me permito repetir o poeta T. S. Eliot: numa terra de fugitivos, aquele que anda na direção contrária parece que está fugindo. Mais: faz escuro, mas eu canto, diria Thiago de Mello, eternizado pela voz de Nara Leão.

Por tudo isso, fazendo minha oração à deusa Palas Atena ao cair da tarde do dia 24 — com o peso de mais de mais de 2.500 anos de história e mitologia —, fico pensando no que vai acontecer com o Direito brasileiro depois disso tudo. Se a moral e os subjetivismos valem mais do que o Direito, o que os professores ensinarão aos alunos? Teoria Política do Poder? Mas de quem? A favor e contra quem? Por isso, de forma ortodoxa, mantenho-me nas trincheiras do Direito. É mais seguro. Aliás, foi o que fez a diferença para a modernidade: a interdição entre a civilização e a barbárie se faz pelo Direito. Até porque, se hoje você gosta do gol de mão, amanhã seu time pode perder com gol de mão. E aí não me venha com churumelas.

Post Scriptum: Há um momento do julgamento de Lula em que o presidente da turma diz: “Terminamos a primeira fase — a das sustentações orais. Faremos um intervalo de 5 minutos e, na volta, o relator lerá seu voto”. Ups. Ato falho? O relator lerá seu voto? E as sustentações? Lembro que, no julgamento mitológico de Orestes, os jurados não tinham o voto pronto. Cada um votou depois de ouvirem a defesa e a acusação. É incrível como, no Brasil, 2.500 anos depois, os votos vêm prontos e não levam em conta nada do que foi dito nas sustentações orais. Nem disfarçam. Afinal, por que manter, então, esse teatro? Se a decisão está tomada? Isso não é um desrespeito a quem sustenta? Insisto: o ensino jurídico no Brasil tem futuro? Ficções da realidade e realidade das ficções! E pior: há milhares de professores que, por aí afora, não protestam contra isso tudo. Aliás, de quem é a culpa do livre convencimento? Os professores são coautores. Artigo 29 do CP na veia. Mesmo assim, resisto.

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*Procurador do Estado aposentado, Mestre, Doutor e Pós-Doutor em Direito Constitucional.  Professor de Direito Constitucional. Autor de 40 livros jurídicos.

Reitor e ideólogo da ULBRA condenado a 7 anos de prisão

Rubem Becker, que foi reitor da ULBRA e o grande arquiteto da obra, foi condenado a 5 anos de prisão. A sentença partiu da 7ª VARA DA JUSTIÇA FEDERAL DE PORTO ALEGRE.  A filha do reitor, Ana Lúcia, também foi condenada.

O EX-REITOR TAMBÉM PODERÁ ser condenado por lavagem de dinheiro, devido aos convênios firmados entre a ULBRA e a Prefeitura de Canoas. A prefeitura mantinha diversos convênios com a ULBRA e tais foram considerados ilegais pelo Ministério Público e o reitor denunciado por lavagem de dinheiro.

 

 

 

 

Rádio Gaúcha anuncia que Heinze está retirando sua candidatura

Notícia bomba da Rádio Gaúcha dá ciência do Estado que surgiram mais dois candidatos a disputarem a convenção com Heinze, Antônio Week de Novo Hamburgo e o Prefeito de Bento Gonçalvez Guilherme Pazzim.

Segundo a Rádio Gaúcha existem descontentamento nas bases pepistas com o nome de Heinze e todos lembram os ataques do deputado aos negros, gays, índios e tudo que não presta. Ademais, lembram o perigo da proximidade de Heinze com Bolsonoro.

Ainda segundo a emissora, Heinze ficou extremamente descontente e deverá voltar a recompor sua base para concorrer a deputado federal.

Ainda não conhecemos a posição pessoal do Deputado, pois por enquanto a notícia é da Rádio Gaúcha.

Ouça o Áudio:

Sobre a penhorabilidade de salário no novo CPC

A execução civil, de modo geral, sempre se pautou pela busca do equilíbrio entre os princípios da efetividade (satisfação do credor-exequente que, no cumprimento de sentença, por exemplo, já enfrentou a demorada fase de conhecimento e ainda não conseguiu o bem da vida pretendido) e da menor onerosidade possível (garantir que os meios expropriatórios disponíveis não afrontem a dignidade do devedor-executado).

Nesse sentido é que, de maneira bastante salutar, o CPC/2015 flexibiliza ainda mais a ultrapassada regra da impenhorabilidade praticamente absoluta do salário (v. CPC/1973, art. 649 – a sistemática anterior excepcionava a regra somente para o pagamento dívida alimentar), permitindo-se a penhora parcial nos casos de pagamento de prestação alimentícia (sejam, os alimentos, familiares ou indenizatórios, frise-se), bem como das quantias salariais mensais que ultrapassem 50 salários-mínimos em qualquer execução (cf. art. 833, inciso IV e §2º).

Ora, de fato, uma coisa é a subsistência do executado depender exclusivamente do pouco que ganha – mesmo assim sujeito a desconto para pagamento parcelado da dívida alimentar e das prestações vincendas até o limite máximo de 50% dos seus ganhos líquidos (cf. CPC, art. 529, §3º).

Outra, bem diferente, é ganhar um salário que ultrapassa as suas necessidades básicas mensais. Nessa última hipótese, por qual razão o valor excedente seria impenhorável?

Daí a correta crítica doutrinária no sentido de que o piso de 50 salários mínimos mensais como parâmetro para o início da penhorabilidade do salário na execução civil, embora represente um avanço histórico (já que o CPC/1973, como se viu, simplesmente dizia ser impenhorável qualquer quantia recebida a título de salário), acaba protegendo um patrimônio que atualmente seria de R$47.700,00 que, certamente, na maior parte dos casos, excede – e muito –, as necessidades básicas mensais de um ser humano.

Nas palavras de Bruno Garcia REDONDO, “O §2º do art. 833 traz significativa inovação no plano legislativo. Pela primeira vez, passa a constar, expressamente, do texto de um Código de Processo Civil Brasileiro, a possibilidade de penhora de parte da remuneração do executado em sede de qualquer execução, ainda que não alimentar: permite-se a penhora dos ganhos do executado que excederem a 50 salários mínimos mensais. (…) Ainda que seja elogiável a moção do legislador de deixar claro que parte da remuneração do devedor pode ser penhorada, mesmo quando o crédito não tiver natureza alimentar, não foi feliz a fixação do ‘teto’ da impenhorabilidade em 50 salários mínimos, valor esse elevadíssimo.

Melhor teria sido o texto legal não prever valores, percentuais etc., deixando a critério do juiz, à luz do caso concreto, identificar o mínimo essencial à subsistência digna do executado e estipular o patamar a partir do qual se tornam plenamente penhoráveis os ganhos do devedor. Afinal, a impenhorabilidade não pode chegar ao extremo de frustrar a efetividade da tutela jurisdicional.” (In. Breves Comentários ao Novo Código de Processo Civil, São Paulo: RT, 2016, p. 2016).

Em resumo: esse parâmetro de impenhorabilidade deveria ser menor ou, simplesmente, não existir, permitindo que o magistrado, no caso concreto, analise qual quantia salarial pode ser penhorada, em prestígio à efetividade executiva, sem levar o executado à miséria.

E mais: independentemente da origem do débito (alimentar ou não).

E parece ter sido exatamente esse o entendimento da 3ª Turma do STJ que, embora aplicando o CPC/1973, recentemente decidiu, no julgamento do REsp 1.658.069/GO, sob a relatoria da Min. Nancy Andrighi, manter a decisão do Tribunal de Justiça de Goiás, que flexibilizou a regra da impenhorabilidade salarial para pagamento de dívidas não alimentares, contida no art. 649 do CPC/73 (art. 849 do novo Código): “DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. PENHORA DE PERCENTUAL DE SALÁRIO. RELATIVIZAÇÃO DA REGRA DE IMPENHORABILIDADE. POSSIBILIDADE. 1. Ação ajuizada em 25/05/2015. Recurso especial concluso ao gabinete em 25/08/2016. Julgamento: CPC/73. 2. O propósito recursal é definir se, na hipótese, é possível a penhora de 30% (trinta por cento) do salário do recorrente para o pagamento de dívida de natureza não alimentar. 3. Em situações excepcionais, admite-se a relativização da regra de impenhorabilidade das verbas salariais prevista no art. 649, IV, do CPC/73, a fim de alcançar parte da remuneração do devedor para a satisfação do crédito não alimentar, preservando-se o suficiente para garantir a sua subsistência digna e a de sua família. Precedentes. 4. Na espécie, em tendo a Corte local expressamente reconhecido que a constrição de percentual de salário do recorrente não comprometeria a sua subsistência digna, inviável mostra-se a alteração do julgado, uma vez que, para tal mister, seria necessário o revolvimento do conjunto fático-probatório dos autos, inviável a esta Corte em virtude do óbice da Súmula 7/STJ. 5. Recurso especial conhecido e não provido”. (STJ, REsp 1658069/GO, 3ª T., j. 14.11.2017, rel. Min. Nancy Andrighi, DJe 20.11.2017).

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Um abraço!

Rafael Alvim e Felipe Moreira.