*Julio Prates
O Presidente Jair Bolsonaro editou a Medida Provisória 979, de 9 de junho de 2020; tal MP concedia ao ministro da Educação, Weintraub, o direito de nomear reitores, pro tempore, das universidades federais.
A MP logo foi bombardeada pela imprensa e os setores acadêmicos do país logo sacaram o discurso de que a “autonomia didático-científica, administrativa, e de gestão financeira e patrimonial” universitária, consagrada no artigo 207 da CRFB/88, estava sendo violado frontalmente.
É claro, falar em Medida Provisória logo emerge um tema paralelo, que é o controle de constitucionalidade.
Mas vejamos, a título de melhor situar o debate, que as MPs também tem previsão constitucional e um rito pré-determinado no próprio texto:
Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.
§ 1º É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria:
a) nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral;
b) direito penal, processual penal e processual civil;
c) organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros;
d) planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, ressalvado o previsto no art. 167, § 3º;
II – que vise a detenção ou seqüestro de bens, de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro;
III – reservada a lei complementar;
IV – já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente da República.
§ 2º Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada.
§ 3º As medidas provisórias, ressalvado o disposto nos §§ 11 e 12 perderão eficácia, desde a edição, se não forem convertidas em lei no prazo de sessenta dias, prorrogável, nos termos do § 7º, uma vez por igual período, devendo o Congresso Nacional disciplinar, por decreto legislativo, as relações jurídicas delas decorrentes.
§ 4º O prazo a que se refere o § 3º contar-se-á da publicação da medida provisória, suspendendo-se durante os períodos de recesso do Congresso Nacional.
§ 5º A deliberação de cada uma das Casas do Congresso Nacional sobre o mérito das medidas provisórias dependerá de juízo prévio sobre o atendimento de seus pressupostos constitucionais.
§ 6º Se a medida provisória não for apreciada em até quarenta e cinco dias contados de sua publicação, entrará em regime de urgência, subseqüentemente, em cada uma das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando.
§ 7º Prorrogar-se-á uma única vez por igual período a vigência de medida provisória que, no prazo de sessenta dias, contado de sua publicação, não tiver a sua votação encerrada nas duas Casas do Congresso Nacional.
§ 8º As medidas provisórias terão sua votação iniciada na Câmara dos Deputados.
§ 9º Caberá à comissão mista de Deputados e Senadores examinar as medidas provisórias e sobre elas emitir parecer, antes de serem apreciadas, em sessão separada, pelo plenário de cada uma das Casas do Congresso Nacional.
§ 10. É vedada a reedição, na mesma sessão legislativa, de medida provisória que tenha sido rejeitada ou que tenha perdido sua eficácia por decurso de prazo.
§ 11. Não editado o decreto legislativo a que se refere o § 3º até sessenta dias após a rejeição ou perda de eficácia de medida provisória, as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência conservar-se-ão por ela regidas.
§ 12. Aprovado projeto de lei de conversão alterando o texto original da medida provisória, esta manter-se-á integralmente em vigor até que seja sancionado ou vetado o projeto.
O próprio texto constitucional é muito claro, seja quanto as vedações, o rito …
Por outro lado, é perfeitamente factível que o STF declare a inconstitucionalidade de uma MP. Esse, pode ser feito através de dois tipos de controle constitucional, o difuso e o concentrado.
É um tema pouco conhecido da sociedade o estudo do controle de constitucionalidade, razão pela qual, vale a pena uma breve reflexão.
A análise relativamente ao controle de constitucionalidade implica em distinguirmos o momento do controle. Qualquer um dos 3 poderes da República podem realizar o controle preventivo e repressivo.
O controle preventivo legislativo é realizado pela análise da CCJ. Assim, quando uma MP é enviada do Executivo ao Legislativo, quem pode declarar a inconstitucionalidade é a Comissão de Constituição de Justiça, a CCJ. O próprio presidente do senado, que também é o presidente do Congresso Nacional (representação bicameral) pode e deve homologar a decisão emanada do CCJ, mas – jamais – devolvê-la de ofício, como foi feito no caso da MP em questão. Foi pautado pela imprensa, o que é uma aberração, e elogiado pelo senso comum estúpido-esquerdista, mesmo daqueles que sabem da incompetência do senador para prática desse ato, o que demonstra ausência de senso crítico e atitude correta jurídico-constitucional.
Ademais, apenas para completar o raciocínio, o Executivo faz o controle de constitucionalidade através dos vetos e o Judiciário , afinal, é o legitimado pela própria CRFB para analisar e declarar a inconstitucionalidade ou a constitucionalidade de uma MP.
Afora o momento preventivo do controle de constitucionalidade, temos – também – o momento repressivo do controle, que pode ser político, jurídico e misto.
É claro, existem – ainda – as espécies de constitucionalidade, positiva ou negativa; da mesma forma, a positiva analisa os vícios formais, materiais e de decoro. A negativa emana da omissão e/ou do silencio legislativo.
Controle de constitucionalidade, em palavras simples, para os leitores sem formação jurídica, é apenas e tão somente uma análise de uma norma em face da constituição, para daí sabermos se tal norma é constitucional ou não.
Já demonstrei que ambos os poderes da República podem exercer o controle de constitucionalidade.
E como se dá esse controle já demonstrei em parágrafo anterior.
De concreto, o presidente Alcolumbre, do congresso nacional, não poderia devolver a MP ao Executivo sem antes à apreciação pela CCJ. A devolução de ofício foi uma enorme inconstitucionalidade.
Nesse caso concreto, repetindo, teríamos duas formas factíveis de controle de constitucionalidade da MP do Executivo. A primeira delas, a mais simples, seria o controle difuso, que poderia ser por ato monocrático de qualquer um dos ministros do STF. É só buscar os legitimados ativos, Artigo 103, I a IX,cujo rol é explícito no texto constitucional. Da mesma forma, poderia se pedir o controle concentrado de constitucionalidade no próprio STF, mas aí a decisão teria que ser coletiva, ou de uma turma ou do plenário. O controle concentrado sempre é exercido pelo colegiado. Friso, contudo, que tal regra não absoluta, pois a CRFB/88, artigo 102, I, “p”, refere-se a medida cautelar em ADIn ou ADI (ou ADC) (ação direta de inconstitucionalidade), assim como na Lei 9.868/de 1999, que acentua acerca da natureza jurídica da liminar concedida em controle concentrado ( que é claramente de antecipação da tutela).
Erraram todos.
Errou o executivo ao afrontar um dispositivo constitucional das universidades federais cuja autonomia está consagrada na própria Constituição, errou o legislativo ao rejeitar a MP sem antes passar pela CCJ e errou – de novo – o executivo ao acatar a devolução, que também feriu preceito constitucional. (É claro, o executivo ficou numa situação complicadíssima, pois recorrer ao STF equivale dizer que seria derrotado, de uma forma ou de outra).
No caso em tela, fica evidente a sucessão de erros.
Daí me perguntam: que caminho eu tomaria diante desse fato?
Levaria a MP ao Ministro do STF, de plantão, e pediria a adoção do controle difuso* de constitucionalidade em decisão monocrática. Pelo menos não se cometeriam tantos despautérios. Embora também fosse possível pedir uma antecipação de tutela em sede de controle concentrado, isso teria a natureza liminar e monocrática.
P.S.: Quando advogava:
1 – Sempre preferi usar o controle difuso, por ser mais ágil, mais célere e sem mais delongas. Por exemplo: na ação declaratória de greve dos servidores municipais de Santiago (RS) aleguei a inconstitucionalidade de lei municipal que não permitia greve no setor público. Tal dispositivo legal municipal era vivamente inconstitucional. Fui exitoso.
2 – Aleguei a inconstitucionalidade lei municipal do município de Nova Esperança do Sul que deu um aumento diferenciado para os servidores municipais. Embora do executivo e aprovada pelo poder legislativo, derrubei a referida lei no controle difuso, na comarca de Jaguari. Fui exitoso.
3 – Aleguei a inconstitucionalidade de lei do município de Capão do Cipó, no controle difuso, na Comarca de Santiago, relativamente aos direitos de verbas rescisórias de secretária municipal de meio ambiente. Fui exitoso.
4 – Alegando a pré-existência de condições insalubres dos motoristas da prefeitura de Santiago/RS, em 32 ações distintas, também no controle difuso, consegui a declaração de ilegalidade da norma e venci as 32 ações nos juízos a quo e ad quem.
5 – Em ação de inconstitucionalidade de ato do governo do Estado, que exonerou servidor público do Estado, fundamentado em lei estadual, ferindo o princípio da mais ampla defesa e contraditório, sustentada em MS, obtive vitória no pleno do TJ, e, nos tribunais superiores. Aqui, foi concentrado, embora tenha perdido em sede de liminar, obtive a expressiva vitória de 25 votos a zero, no mérito, no pleno do Tribunal.
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*Jornalista, registro no MTb-RS 11.175. Editor do Blog, desde o dia 22 de março de 2002. Outros domínios: http://jornalistaprates.blogspot.com/ e http://www.julioprates.blogspot.com/
Advogado, OAB-RS 87.557
Bacharel em Sociologia
Pós-graduado em Leitura, Produção, Análise e Reescritura Textual
Pós-graduado em Sociologia Rural